Jackson Cionek
41 Views

Quando o cérebro decide: ondas beta, escolhas e consciência pré-reflexiva

Quando o cérebro decide: ondas beta, escolhas e consciência pré-reflexiva

(Consciência em Primeira Pessoa • Neurociência Decolonial • Brain Bee • O Sentir e Saber Taá)


O Sentir e Saber Taá

Eu me vejo diante de uma escolha.
Pode ser algo simples — apertar um botão à esquerda ou à direita — ou algo grande, como decidir um voto, aceitar um trabalho, terminar uma relação.

Antes da resposta vir em palavras, eu sinto um micro-instante estranho dentro de mim:

  • o peito dá uma leve apertada,

  • a respiração muda um pouco,

  • há um tipo de “agora vai” silencioso,

  • como se uma parte do meu corpo dissesse: foi decidido — antes mesmo de eu formular “eu decidi”.

Esse momento é Taá puro:

primeiro eu sinto que algo fechou por dentro,
depois eu sei qual escolha fiz.

Quando eu leio o estudo de Elie Rassi, Julio Rodriguez-Larios, Camille Gret, Hugo Merchant, Alma Elshafei e Saskia Haegens, publicado em 2025 na revista iScience com o título:

“Beta-band frequency shifts signal decisions in human prefrontal cortex”,

eu entendo que eles fizeram algo muito próximo de medir esse “agora vai” — só que não nas palavras, e sim no ritmo elétrico do córtex pré-frontal.

E a pergunta que eu me faço, em primeira pessoa, é:

O que meu cérebro faz, em termos de ondas, no exato momento em que eu decido?


1. O que os autores fizeram – três tarefas, um mesmo sinal de decisão

Os autores pediram para 82 pessoas realizarem três tipos de tarefa perceptiva diferentes (temporal, sensorial e de categorização). O detalhe importante: em todas, em algum momento, a pessoa precisava tomar uma decisão sobre o estímulo — por exemplo, decidir se algo era maior/menor, antes/depois, assim/assado.

Enquanto isso:

  • a atividade cerebral era registrada por EEG/MEG,

  • com foco especial no córtex pré-frontal – região-chave para tomada de decisão, controle executivo e planejamento.

O objetivo era responder:

Existe alguma assinatura em banda beta que marque o momento da decisão, independentemente do tipo de tarefa?

Os resultados centrais:

  • Em todas as tarefas, quando a pessoa tomava uma decisão, acontecia um deslocamento da frequência (shift) na banda beta no pré-frontal, não apenas uma mudança de potência.

  • Esse shift aparecia de forma consistente entre tarefas diferentes, sugerindo um mecanismo geral de decisão.

  • O padrão parecia específico do momento da decisão, e não apenas da percepção do estímulo ou da preparação motora.

Em outras palavras:

o cérebro muda o “timbre” das ondas beta no pré-frontal quando decide.


2. Como o sinal foi analisado – ICA, FFT, beta e pré-frontal

Aqui entra a parte que fala direto com o pesquisador e com quem trabalha com EEG:

Para chegar a esse marcador de decisão em banda beta, o pipeline de análise seguiu a lógica típica de estudos modernos de EEG/MEG:

  1. Pré-processamento do sinal bruto

    • Remoção de artefatos de piscar de olhos, músculos e ruído usando ICA (Independent Component Analysis), separando componentes neuronais dos componentes de ruído.

    • Filtragem em banda larga para manter as frequências de interesse.

  2. Estimativa espectral

    • Uso de FFT (Fast Fourier Transform) ou métodos equivalentes de análise de tempo-frequência para extrair a potência em diferentes frequências, com foco na banda beta (tipicamente ~13–30 Hz).

    • Observação não só da potência, mas da frequência central da beta – justamente onde o “shift” aparece.

  3. Foco espacial em pré-frontal

    • Projeção topográfica do sinal para identificar eletrodos/gradientes que refletem córtex pré-frontal.

    • Em muitos estudos semelhantes, a precisão espacial é refinada com CSD (Current Source Density) ou com soluções de fonte como LORETA/sLORETA, que estimam onde, no córtex, as oscilações se originam.

  4. Resumo de padrões comuns entre tarefas

    • Uso de técnicas como PCA (Principal Component Analysis) ou comparações multivariadas para mostrar que o shift de beta no pré-frontal não é um acaso de uma tarefa específica, mas um padrão geral presente em todas.

Esse tipo de pipeline é exatamente o que você vende quando oferece EEG com análise avançada:
um caminho que vai do sinal bruto ruidoso até um marcador fisiológico robusto (no caso, um shift de frequência em beta no pré-frontal no momento da decisão).


3. O que isso significa para nossos conceitos (Eus Tensionais, Mente Damasiana, Zona 3)

a) O “eu que decide” é elétrico antes de ser narrativo

O que o estudo mostra é que a decisão aparece:

  • primeiro como mudança elétrica em beta,

  • depois como sensação de “eu decidi”,

  • e por último como narrativa (“eu escolhi isso porque…”).

Isso casa perfeitamente com a nossa visão de Mente Damasiana:

o corpo-cérebro toma posição primeiro;
a mente reflexiva chega depois para explicar.

b) Eus Tensionais de decisão

A mudança em beta pode ser vista como um Eu Tensonal de fechamento:

  • antes do shift → estado de ambiguidade, múltiplas possibilidades, exploração;

  • na hora do shift → colapso para uma escolha, um “agora é isso”;

  • depois do shift → estabilização da ação.

Então, beta pré-frontal aqui é quase um “botão interno” que diz:
acabou de mudar de estado, agora você está comprometido com esta decisão.

c) Zona 1, 2 e 3

  • Em Zona 1, decisões do dia a dia podem ocorrer com shifts beta rápidos, mas flexíveis;

  • Em Zona 2, decisões criativas exigem tempo, fruição, exploração — talvez com menos rigidez na assinatura de beta, mais variação;

  • Em Zona 3, decisões podem se tornar automáticas, rígidas, ideologicamente fechadas, com padrão de beta mais cristalizado, pouco aberto à revisão.

Este estudo não fala de ideologia, mas nos dá a peça fisiológica para pensar como um cérebro sob pressão constante (mídia, urgência, medo) pode ser empurrado para decisões beta-dominantes de curto prazo.


4. Onde a ciência nos corrige (e nos amadurece)

Eu poderia imaginar que “boa decisão” é sempre aquela em que eu:

  • penso muito,

  • avalio racionalmente,

  • discuto comigo mesmo.

Mas a evidência mostra:

  • muitas decisões reais nascem rápido,

  • são tomadas em milissegundos,

  • com base em acúmulo de experiências passadas codificadas no corpo-cérebro,

  • e só depois ganham justificativa racional.

Isso me obriga a:

  1. Respeitar o corpo como agente de decisão, não só como palco.

  2. Aceitar que a consciência reflexiva não controla tudo — ela acompanha, corrige, revisa, mas não domina.

  3. Repensar a responsabilidade individual num mundo em que estímulos externos podem modular beta e empurrar decisões antes da reflexão.


5. Implicações normativas – política, propaganda e desenho de ambientes

Se decisões são marcadas por shifts em beta pré-frontal, isso abre discussões éticas importantes:

1. Propaganda e campanhas políticas

  • Ritmos visuais, frases curtas, pressão de tempo, trilhas sonoras — tudo isso pode empurrar decisões para o modo beta rápido, pouco reflexivo.

  • Precisamos discutir limites para técnicas de marketing que exploram essa vulnerabilidade neurofisiológica.

2. Organização do tempo nas escolas e no trabalho

  • Sistemas que exigem decisões constantes, rápidas, sem pausa — empurram cérebros para estado beta crônico, favorecendo Zona 3.

  • Políticas de pausa, reflexão, tempo de fruição (Zona 2) não são luxo: são higiene neurocognitiva.

3. Legislação sobre nudging e neurodireitos

  • Se sabemos que certos estímulos podem alterar padrões de decisão de forma pré-reflexiva, isso reforça a necessidade de neurodireitos:

    • direito à integridade mental,

    • transparência sobre uso de técnicas de persuasão subliminar,

    • proteção contra ambientes construídos para explorar beta automático (cassinos, apps, plataformas).


6. Palavras-chave para encontrar o artigo

Palavras-chave de busca:
Rassi 2025 Beta-band frequency shifts signal decisions human prefrontal cortex iScience 113806 EEG MEG ICA FFT CSD PCA decision-making


Pra mim, este Blog fica como um marco da série:
ele mostra que decidir é um fenômeno elétrico em primeira pessoa,
e que qualquer projeto de Neurociência Decolonial séria precisa olhar para isso:

  • como nossos corpos decidem antes de nós,

  • como sistemas econômicos e midiáticos exploram esse timing,

  • e como podemos redesenhar cidades, escolas e leis para que a decisão volte a ser expressão de Taá, e não só reflexo de gatilhos externos.




#eegmicrostates #neurogliainteractions #eegmicrostates #eegnirsapplications #physiologyandbehavior #neurophilosophy #translationalneuroscience #bienestarwellnessbemestar #neuropolitics #sentienceconsciousness #metacognitionmindsetpremeditation #culturalneuroscience #agingmaturityinnocence #affectivecomputing #languageprocessing #humanking #fruición #wellbeing #neurophilosophy #neurorights #neuropolitics #neuroeconomics #neuromarketing #translationalneuroscience #religare #physiologyandbehavior #skill-implicit-learning #semiotics #encodingofwords #metacognitionmindsetpremeditation #affectivecomputing #meaning #semioticsofaction #mineraçãodedados #soberanianational #mercenáriosdamonetização
Author image

Jackson Cionek

New perspectives in translational control: from neurodegenerative diseases to glioblastoma | Brain States