Tassia Nunes
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O fechamento do palco da vida: Como o EEG auxiliou em uma nova descoberta científica

Os últimos momentos de vida sempre foram uma incógnita ainda não resolvido pela comunidade científica. O interesse em compreender o que acontece durante esse momento, que marca o fechamento da jornada de uma personalidade, rodeia o imaginário popular e dos grandes astros do cinema. Filmes de ficção científica acerca do que acontece no fenômeno da morte inspirados pela genialidade de grandes roteiristas hollywoodianos e que despertam a imaginação, criatividade, inspiração e curiosidade da sociedade foram sucesso de bilheteria. Entretanto, o imaginário nos palcos do cinema talvez não poderiam cogitar a possibilidade de um dia os ensaios protagonizados nas lentes dos cenários cenográficos dessem vez para abertura das cortinas para desvendar o fenômeno da morte pela investigação dos cientistas. Mais uma vez, a ficção científica dá lugar à realidade.
Ciclo natural da vida humana, a morte é o destino final da jornada da vida. Esse fenômeno natural do ser humano ainda é rodeado de muitas incertezas, misticismo e eventos não compreendidos pela ciência. Dúvidas acerca da continuidade da vida após a morte e os processos fisiológicos durante a passagem ainda são investigados pelos pesquisadores mundiais. O fenômeno da morte sempre foi muito cultuado pelas civilizações mais antigas. Os Egípcios e seus processos de mumificação são um dos exemplos mais clássicos de como os povos compreendiam esse evento. Para essa civilização, a morte era apenas uma passagem e a vida tinha sua continuidade em uma outra dimensão, por esse motivo, o povo egípcio desenvolveu a famosa técnica da mumificação.
Além do misticismo em torno da cultura popular acerca da morte, os filmes de ficção científica também são grandes exemplos de como esse tema ainda é um tabu para todos. "Além da morte" e "A descoberta", são exemplos de filmes que em seus enredos tem como narrativa sobre o que acontece durante o fenômeno da morte. Nos filmes, cientistas utilizam tecnologias capazes de realizar o registro da atividade cerebral de pessoas em experiências de quase morte (EQM) e tentam desvendar os mistérios acerca da vida durante EQMs. Na realidade cinematográfica falar um pouco mais dos que acontece no filme durante a morte.
Entretanto, esses mistérios talvez estejam dando os primeiros passos em uma longa jornada para sua resolução, a fim de que a humanidade compreenda esse fenômeno em sua totalidade. Cientistas em uma pesquisa intitulada Enhanced Interplay of Neuronal Coherence and Coupling in the Dying Human Brain liderada pelo pesquisador Ajmal Zemmar descobriu recentemente que o cérebro humano pode recordar memórias durante o processo de morte. Esse fenômeno é muito característico de pacientes que sofreram EQMs, e ao voltar a vida, relatam que passaram pelo fenômeno de reviver lembranças. O novo estudo científico pode corroborar com os relatos dos pacientes que sofreram EQM.
A descoberta feita pelo grupo de Zemmar trata-se na verdade de um acidente científico. Durante procedimento de análise da atividade cerebral utilizando o eletroencefalograma (EEG) em um paciente de 87 anos com quadro clínico de epilepsia, em evento inesperado, o mesmo sofreu infarto cardíaco e veio a óbito. A análise das ondas cerebrais produzidas pelo paciente 30 segundos antes e depois do óbito revelaram ter padrão semelhante aos gerados durante o processo fisiológico de memória, os quais são caracterizados por uma elevação acentuada de ondas gama. Esse achado científico demonstra que o mesmo padrão neural gerado por indivíduos saudáveis ao evocar memórias foi similar ao que aconteceu no padrão neural analisado pelos cientistas no paciente durante o processo de morte.
Mais uma vez, as tecnologias, como o EEG, utilizada na pesquisa descrita acima, foi fundamental para ampliar o conhecimento científico acerca da vida humana. O EEG é uma técnica não invasiva de registro eletrofisiológico utilizada para medir a atividade cerebral dos neurônios. Esse equipamento tem sido amplamente utilizado na medicina, pesquisa científica e inclusive em tecnologias mais avançadas de interação homem-máquina.

Referência:
- Enhanced Interplay of Neuronal Coherence and Coupling in the Dying Human Brain. Raul Vicente, Michael Rizzuto, Can Sarica, Kazuaki Yamamoto, Mohammed Sadr, Tarun Khajuria, Mostafa Fatehi, Farzad Moien-Afshari, Charles S. Haw, Rodolfo R. Llinas, Andres M. Lozano, Joseph S. Neimat and Ajmal Zemmar. Frontier in Neuroscience, 2022.